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terça-feira, 5 de agosto de 2008

Gatos

... O Cinzento trouxe ele poucos meses antes de morrer. Só tomamos plena consciência disso depois que o Cinzento morreu, mas no momento foi só um contra-tempo, inexplicável capricho felino. Olhando para trás, não posso negar que houve algo de profético no ato.

Ele se instalou dentro de casa. Na verdade, não queria sair para a rua. O meu pai o enxotou uma vez, mas logo percebemos que ele estava embaixo do fogão novamente.

Foi o lugar que ele escolheu: embaixo do fogão. Ficava lá, espiando-nos, só com a cabeça para fora. Esgueirava-se até a comida passando por baixo da pia. Considerava o Cinzento a sua família. Cinzento o tratava com descaso e desdém realmente paternais.

Tinha uma relação ambígua com as pessoas. Temia-as, certamente foi maltratado e recebeu calor humano de sobra para não o querer mais. Mas queria carinho. As vezes, ao brincar com um pedaço de papel amarrado num fio, acabava - empolgação perdoável, afinal era só um filhote - saindo debaixo da pia. As vezes, conseguíamos pegá-lo.

Gostava e não gostava de colo, de toques. Gostava quando passávamos a mão nele, mas fugia na primeira oportunidade: medo. Quando eu sentava junto ao balde de lixo e ficava imóvel por um tempo suficientemente longo, ele se aproximava.

Era siamês, de olhos azuis. Engordou rapidamente, merecendo o apelido de barriga. Nos o doamos. Espero que esteja bem. Certamente está: é um gato esperto.

O Cinzento já começava a adoecer naquela época. Morreu poucos meses depois, e nós haviamos doado esse gatinho que ele trouxe. Um peso a mais na consciência.

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